Recomendações de Alguns Clássicos do Cinema Japonês

Três dicas supimpas para os amantes da sétima arte.
 
Depois de um longo período sem postar nada na coluna ''Cinema Oriental'', cá estou eu novamente pra levantar a poeira e colocar essa budega pra funcionar direito. Espero atualizar mais vezes, mas tudo no seu tempo.

Lembrando que recomendações de filmes orientais são bem vindas, e pode ser que eu comente aqui o que achei mais tarde. É isso, se sinta livre para comentar, compartilhar e etc. 

Contos da lua vaga (1952)
(Ugetsu Monogatari)
Diretor: Kenji Mizoguchi
Ganhou o Leão de Prata no Festival de Veneza de 1953.


A guerra deixa as pessoas loucas. Esse filme vai mostrar isso de várias perspectivas. Desde o lado da vítima, até do transgressor. Porém, todas elas estão, literalmente, no mesmo barco. O que une todos os personagens é a loucura perante a guerra, juntamente com a ambição e o egoísmo.

''Contos da Lua vaga'' vai se focar na vida, mais especificamente, de quatro personagens que estão tentando sobreviver em meio à miséria e violência que se espalha no vilarejo rural onde moram. São dois casais, tendo um deles, um filho, vivendo no século XVI em um Japão feudal violento e cheio de desgraça. O pai do menino é um baita de um trabalhador, e ganha a vida fazendo cerâmica e o outro homem, o ajuda quando pode, mas sua intenção mesmo, é se tornar um samurai reconhecido. Um dia, os dois vão com suas respectivas esposas, para um vilarejo mais movimentado, afim dos seus negócios darem mais lucro, só que um imprevisto acontece no meio do caminho, e uma das esposas se vê obrigada a voltar juntamente com seu filho para sua terra perigosa, e esperar pela volta de todos. 

Quando eles chegam nesse lugar para enfim venderem seus produtos, e assim, quem sabe, ficarem ricos, vários contratempos acontecem. Um dos homens - que tinha o sonho de ser um samurai- abandona sua esposa e seu amigo ali, para realizar sua ambição. Sua esposa sai correndo à procura dele, mas não o encontra em lugar algum. Ela acaba sendo raptada por vários homens, e infelizmente, é estrupada por eles. Agora ela terá que se acostumar com sua nova vida de prostituta, se não quiser morrer na miséria - já que seu marido a abandonou. O outro homem porém, continua ali concentrado em seu objetivo, e, ao contrario de seu amigo, pensa muito no bem-estar de sua mulher que está lá naquele lugar perigoso e pobre, esperando por ele. No entanto, esse amor por sua mulher também acaba o levando ao delírio completo.

Esse filme, não é nenhum pouco parado. O ritmo dele é muito bom porque a narrativa é bastante alarmante. A todo momento está acontecendo algo, e não tem como não ficar curioso e atônito do começo ao fim. Têm várias pequenas reviravoltas, e é surpreende em cada cena. Você se sente na pele de cada personagem, sofre e torce por eles. E o final dá um baita show de fotografia. Sério, é épico em todos os sentidos. É maravilhoso quando o ângulo da câmera vai distorcendo a realidade do que estamos vendo, e vamos enlouquecendo junto com o personagem. É sensacional!!!!

A direção de Kenji Mizoguchi nesse filme, é algo para ser estudado por todos os amantes de cinema. Inspirado em dois contos de Akinari Ueda, o cineasta toca num assunto que ainda é atual na sociedade em que vivemos; a de que o ser humano nunca se contenta com o que tem. Querer sempre algo mais e não reconhecer o que já possui, leva o homem à ruína. 

Com uma direção impecável, Contos da lua Vaga vai destecer diante dos nossos olhos uma belíssima história, envolvendo fantasia e mistério. Sem exageros: vale muito a pena assistir cada segundo desse filme. Clássico obrigatório.

O egoísmo é como uma névoa. Nessa cena, isso fica bem explícito 







                               A Balada de Narayama (1983)
(Narayama Bushiko)
                                                               Diretor: Shohei Imamura
Vencedor de 9 Prêmios e 8 Indicações
- Palma de Ouro Cannes 1983
- Awards of the Japanese Academy
- Blue Ribbon Awards
- Hawaii International Film Festival
- Hochi Film Awards
- Mainichi Film Concours

Esse filme é uma verdadeira aula, em todos os âmbitos. Não só porque conta uma análise da ideologia nacional japonesa nos tempos de guerra, ele também explora a prática cultura Ubasute (praticada no Japão num passado distante, na qual um parente enfermo ou idoso era carregado até uma montanha, ou algum outro ponto remoto, e abandonado ali para morrer, seja por desidratação, fome ou hipotermia), e sabe por sua vez fazer bom uso da tradição Kabuki (que é uma forma de teatro japonês, conhecida pela estilização do drama e pela elaborada maquiagem utilizada pelos seus atores).

''A Balada de Narayama'' se passa no fim do século XIX, em meio à miséria e pobreza que causavam guerras e emigração para terras estrangeiras (inclusive esse é o principal motivo de ter tantos japoneses na nossa cultura), durante uma luta amarga pela sobrevivência. Uma tradição bastante corajosa e sofrida se paira com os idosos, moradores dos humildes vilarejos. Nela consiste em subir ao topo da montanha local, numa região sagrada e esperar pela própria morte, completamente solitários.

O filme super premiado é baseado no romance de Shichiro Fukazawa, e é dirigido por ninguém menos que Shohei Imamura. O principal sentimento que senti exposto no filme é a relutância perante uma tradição tão amarga. Nós sabemos que o Japão desde sempre é mega regrado, cheio de deveres e tradições. Mas às vezes não temos a noção no quanto nem eles mesmos, concordam em ser tradicionalistas ao extremo. A obra é relevante por justamente mostrar esse perversão perante as normas culturais e morais que é oculta para maioria de nós, numa sociedade bastante primitiva. 

Pode ser que esse filme se torne um martírio para aquela pessoa que não tem quase nenhum contato com o cinema clássico japonês, no entanto, será um achado e tanto para aqueles que procuram uma obra atemporal, bem contextualizado, e repleto de significados. Tenho certeza que depois de assistir esse filme, você repensará o significado de ''asilo''. Confesso que meu coração ficou em lágrimas ao final, quando mãe e filho obedecem com muito pesar uma tradição triste. Porém fiquei mais ressentida ainda, quando me dei conta, que ainda nos dias de hoje, existem pessoas que abandonam seus pais idosos por conta de suas obrigações ou até mesmo por maldade. Apesar de ''A Balada de Narayama'' ser muito carregado de sentimentos sombrios, ainda sim, é mais bonito e humano que nossa própria humanidade atual, onde pessoas nem sequer sentem qualquer coisa por seus entes queridos, que morrem de solidão e abandono num lugar qualquer, como Narayama.

Kwaidan - As Quatro Faces do Medo (1964)
(Kaidan)
Diretor: Masaki Kobayashi
Indicado ao Oscar de melhor filme estrangeiro em 1966
Prêmio Especial do Júri no Festival de Cannes de 1965

Já pensou como seria Mushishi numa versão Terror? É mais ou menos esse o estilo desse filme. O diretor Masaki Kobayashi destece quatro contos distintos ressaltando sons, cores, silêncio e sentidos, numa narrativa extremamente tensa e sombria, capaz de gelar a espinha de quem assiste à cada pequena reviravolta. 

O primeiro conto se trata de um homem que abandona sua esposa para conseguir uma vida melhor, no entanto, ao se casar com outra, ele não consegue deixar de pensar em sua antiga esposa. Confesso que essa história foi a que menos gostei. Achei bem arrastada e previsível. Mas os minutos finais desse conto sabe acordar qualquer um do sofá.

Já o segundo, por sua vez, conta a história de dois lenhadores que são surpreendidos por uma mulher misteriosa em meio à uma baita nevasca. Um deles acaba tendo seu sangue sugado por ela, enquanto que o outro tem sua vida poupada com a promessa de nunca contar do ocorrido.  Acredito que você consegue imaginar onde isso vai dar, certo? Ainda sim, é um conto muito curioso por justamente não saber em que momento essa ''bomba relógio'' vai explodir. A fotografia também, são de arrepiar.

O terceiro conto é o meu preferido. É o que o Japão sabe fazer de melhor no suspense como não antes visto. Hoichi é um jovem cego aprendiz de monge que canta muito bem, porém, numa noite qualquer ele é visitado por um samurai misterioso e tudo muda para ele. Bom, não vou contar mais que isso pra não revelar muita coisa, mas o que posso dizer é que é bem amedrontador.  No entanto, não é de um jeito estrondoso, cheio de acontecimentos horrendos e etc, mais de um jeito calmo, tranquilo, o que na verdade, chega à assustar mais por não sabermos o que está por vir. E é justamente esse suspense que traz todo o brilho da história. 

No quarto e último conto, temos um oficial que enxerga um homem numa xícara e mais tarde, acaba encontrando esse homem cara a cara. O principal encanto dessa história é que aqui vemos a loucura no seu formato mais belo; aquele em que ela se funde com a realidade.

Enfim, esse é um filme pra quem tem paciência, pois o ritmo é muito sossegado. Cada uma das histórias tem o seu brilho à sua maneira, mas o que une todas elas, é a sensualidade em que o desconhecido (seja do plano físico ou mental) proporciona para pessoas como eu e você. Curiosas.








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